Por Johniere Alves Ribeiro
“Caixas de frutas vermelhas ricas em polifenol”. Creio que este verso é um universo inserido no interior do novo livro de Noélia Ribeiro: “Assim não vale” (Arribaçã Editora, 2022). Nele temos poemas que são verdadeiros compostos bioativos com suas estruturas químicas múltiplas, dispostas em formas de letras no papel, constituindo, portanto, uma escrita polifenólica, literalmente.
Além desse aspecto, compreendo que o emboço dos poemas de Noélia fomenta “lugaridades”. Isso mesmo. Não de “espacialidades” em seu sentido tradicional. Digo isto porque a percepção de lugaridades é mais múltipla, é mais abrangente do que pensarmos sobre o espectro de espaço. Nesse sentido, lugaridades oferta uma conotação mais adequada para o gênero lírico e nos desloca do contexto meramente físico da ideia de espaço. E assim vale? Vale muito. Viu Noélia? É o que acontece com o poema “Parquinho”: “A espera já dura semanas/ Ela ajeita-se ao banco/ [as costas já não doem mais] / Pisca uma dezena de vezes / sob a luz estroboscópia do sol”. Nesse fragmento fica-nos evidente que o espaço meramente físico de do parquinho não ganha o tom nos versos. Contudo, a harmonia, a retumbância da lugaridade potencializa os versos da poeta. O mesmo ocorre nos poemas: “Invejo-te”, “Poço dos desejos”, “A pedra”, “Gambiarra”, “Desjardim” dentre outros.
Isso posto, o livro “ Assim não vale” faz com que o leitor de poesia se instale, se interponha nas lugaridades versícas que a construção poética da poeta se torne algo muito mais que um experimentalismo. A vérsica dela se faz rizoma, nos bulbos vermelhos das frutas em polifenol. Desse modo, nos é intuído organizar para desorganizar e está tudo bem. Ponto. Lugaridades tem disso, não é preciso estar “perfeitinha”, “orientadinha” nossa existência. E tudo bem, também.
O livro que o DE OLHO NA ESTANTE indica aciona no leitor a capacidade de juntar e de espalhar ao mesmo tempo, deixando-o completamente ON. Num esforço sisífico, mas com uma telemaquia, sem a necessidade desesperada de um pai e deslocada de uma relação físico/espacial. Daí o trânsito sem fronteiras entre os mais variados temas: o amor, a solidão, o erotismo, a memória ou até mais o “não querer fazer” proposital, como foi a decisão de Bartleby. Tudo feito na condição da rotina comum, ao olho nu do cotidiano, da lugaridade que se faz em mim, em vocês e nos fricciona em nós mesmos, bem como no dentro e fora das palavras. E são delas que emulam belas formulações imagéticas, tais como: “ Na sala nuvens gaguejam claridade” ou o “espelho do carcará”. Olha aí de novo as lugaridades.
Portanto, ler “Assim não vale” vale a pena. E nós do DE OLHO DA ESTANTE indicamos.
Johniere Alves Ribeiro é professor-doutor e resenhista parceiro da Arribaçã. O texto acima foi publicado na seção “DE OLHO NA ESTANTE”, em seu perfil no instagram: @johniere81
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O livro “Assim não vale”, de Noélia Ribeiro, pode ser adquirido no site da Arribaçã no seguinte link: http://www.arribacaeditora.com.br/assim-nao-vale/