FANTÁSTICA PARAÍBA

Por André Ricardo Aguiar

 

É notório que Cortázar, um autor de muitas obras primas do conto fantástico, cunhou uma frase muitas vezes citadas em cursos, em textos acadêmicos, em artigos sobre literatura. Mais ou menos isto, o romance ganha por pontos, o conto por nocaute. Eu diria que o conto fantástico dá um salto um pouco maior, esse nocaute parece estar espalhado por toda a luta no ringue das palavras. É como se a realidade estivesse sob ataque constante, mesmo sutilmente. É por isso que acho que o fascínio pelo conto fantástico é algo inerente ao leitor. Não se entra num livro deste naipe sem ter aquele frisson. Algo vai acontecer de forma misteriosa e subterrânea.

Não sei definir bem o fantástico e esta apresentação não terá ares de ensaio ou estudo alentado. É mais um convite para quem abrir este livro e se deparar com concepções próprias de quem quis contar a sua versão para a fissura do real. Sou da opinião de que mostrar tem mais efeitos do que tentar explicar o inexplicável. A seleção não desceu às minúcias, não buscou fidelidade de gênero – e que gênero hoje é fiel, se há tantas boas contaminações? Também esta coletânea não ousa esgotar o manancial de tudo o que se produz aqui com estes parâmetros. É uma escotilha onde podemos espiar um pouco a variedade de estilo e concepção artística para o tema.

Recebi o convite da Arribaçã com certo temor. Acho normal. Como em tudo que diz respeito ao movimento literário de nossa época, o presente é vasto, e é preciso muito mais que dar as mãos. O heterogêneo pede certa disciplina. E há muitos autores, e cada um é um universo. Por isso, uma nova investida numa antologia para o conto paraibano precisou ser temática, mas dentro de um espaço amplo, pois a pegada do realismo mágico, maravilhoso ou qualquer outro adjetivo aproximativo tem tantas variantes quanto as impressões digitais de um criminoso descontrolado. No entanto, ainda é possível contar com ajuda, com o uso do velho e bom e-mail, com os diálogos entre os pares, para achar aí um corpus significativo que dê conta do alcance do gênero entre os mais variados autores, jovens e veteranos, publicados ou não.

Uma representação ampla em todo o estado. Um leque de vozes. Todos os que participam toparam a parada e deram versões próprias do maravilhoso e do fantástico aqui, e que deixam aos leitores o fio de Ariadne para penetrar no labirinto. É bom frisar que o conceito em si não norteou tanto a escolha destes contos, mas o clima com que estas histórias trazem, esse algo que Todorov chama de hesitação: a linha tênue e oscilante entre o lógico e o ilógico, o natural e o sobrenatural, o real e o imaginário.

Por enquanto, vale frisar que o trabalho de recolha dos textos selecionados não termina aqui. O Paraíba é um manancial de criatividade, de espírito de resistência, de práticas de linguagens. A literatura é um passaporte libertador. E é preciso integrar essa geografia de ponta a ponta. A arte de contar histórias é antiga, e basta pesquisar um pouco que essa herança criou muitos frutos, tanto pelos suplementos culturais, os movimentos literários, e mesmo o patrimônio da terra que é o Correio das Artes, até as novas publicações, os meios de difusão na era da internet, os sites e os blogs. Estamos apenas seguindo a correnteza.

Casa Encantada – o conto fantástico paraibano apresenta 25 contistas dos mais variados estilos, e os 50 contos que aqui estão apresentam situações inusitadas, ângulos de uma realidade que tanto se mostra misteriosa ou imprevisível quanto humana. Qual a medida do fantástico, então? Cabe ao leitor, com a sua arte de buscar sentido, decidir. Boa leitura!

______________________

 

O livro “Casa Encantada – O conto fantástico paraibano”, organizado por André Ricardo Aguiar, pode ser adquirido AQUI

Deixe uma resposta