Um domingo de pausa, muita luz, sombra e café fresco.
Uma pausa em ambiente adequado para terminar de ler um romance que gira em torno de afetos, entre irmãs e seu mundo, seus mundos. “O coração pensa constantemente”, de Rosângela Vieira Rocha.
Este comentário de leitura que, eventualmente pode soar fora de lugar ou esquisito, foi lido em circunstâncias especiais e certamente serão lembradas a cada vez que retirar o livro da prateleira ou cair em minhas mãos por qualquer outra razão.
Adquiri o livro no final do ano passado, ainda em pré-venda na Editora Arribaçã. Deu-se um jeito para que chegasse autografado pela autora. O volume foi parar na pilha dos “a serem lidos”, em crescimento quase diário, mas acabou furando a fila e, diga-se, num momento bastante estranho, quando, após uma tempestade, ficamos sem energia elétrica em casa por uma noite inteira. No escuro, sem sono, puxei um livro qualquer da pilha e… era esse! Tentei a luz da vela, mas não foi possível, pois aquele bruxulear da chama fazia sombras na página. Sem nenhuma outra fonte de iluminação. Finalmente, veio a ideia de experimentar a lanterna do celular. Raramente aproveito as múltiplas funções desse diabólico aparelhinho. Não sem algum malabarismo para fixar o celular com o foco da luz dirigido ao livro, a coisa funcionou. E assim decorreu a primeira leitura, até o capítulo XXIII, próximo da 100ª página.
Neste domingo, o livro escolhido a ser levado comigo para o refúgio secreto na mata atlântica foi justamente esse. E foi lá que voltei a me emocionar com uma narrativa fascinante sobre a amizade entre duas irmãs que durou uma vida.
Não fosse a autora quem é, com um lastro de, pelo menos, três dos seus romances premiados e de alta voltagem literária, este tema, inevitavelmente, correria risco grande de cair no pieguismo. Entretanto, nem por um momento ou simples parágrafo que seja, isso acontece. Apesar da dor e do luto da narradora, o humor, marcadamente nos capítulos que decorrem em flashback, está presente como pausa para respiro. Habilmente dividido em quarenta curtíssimos capítulos a intercalar passado e presente, a narrativa não deixa esmorecer o desejo do leitor em continuar.
Sou leitora de Rosângela desde os primeiros livros de contos, nos já distantes anos 80 do século passado e tenho a imensa alegria em, a cada nova obra, senti-la plena de frescor criativo, jamais se repetindo.
Em tempo: este foi um texto que rascunhei rapidamente logo após a leitura de seu livro, Rosângela. A intenção era enviá-lo por mensagem pessoal à autora, inclusive com as “ilustrações”.
Afinal pensei que, ao torná-lo público, cumpro o dever, em nome da cumplicidade e admiração que lhe devo, como leitora, admiradora e camarada de trocas e andanças literárias, em especial, nos últimos quatro ou cinco anos, através da militância comum no grupo feminista Mulherio das Letras.
Espero pelo próximo, não sem a costumeira expectativa.
E, finalmente, um grande viva às mulheres que, neste momento de escuridão, dão à luz o melhor da literatura brasileira.