Por José Nunes
A cada livro que Solha publica, repetimos “olé”, imitando o público em êxtase diante do drible do toureiro na arena.
Me aproximei dele quando frequentávamos o terraço de Nathanael Alves, em Tambauzinho, em bocas da noite povoadas de estrelas das artes e do saber. Eu escutava a conversa dos dois, mas não ofereceria meu pitaco sobre assuntos de literatura. Sempre fui do time da escuta. Escutava, refletia e meditava sobre o que conversavam.
Solha levou-me a admirar seu trabalho de escritor, romancista premiado, poeta versátil, autor de textos polêmicos, como por exemplo “A Verdadeira Estória de Jesus”, em que, mesmo sendo obra de ficção, buliu com certas ideias fixas de católicos e evangélicos porque afirmava ser o Messias uma criação que apontava caminhos para a salvação do homem.
Repórter iniciante em O Norte, fui escalado por Evandro Nóbrega para entrevistar Dom José Maria Pires sobre este livro de Solha. Diplomaticamente, o bispo rebateu as insinuações do escritor. Na tréplica, o autor da polêmica obra até concordou com bispo, mas reafirmou a sua teimosia de ficcionista, de que “Jesus nunca existiu”.
No fervor poético da adolescência, alimentado pelas emoções de apaixonado por uma musa residente em minha cidade e contaminado pelo romantismo de Gonçalves Dias e Cassimiro de Abreu, mostrei-lhe alguns poemas, curtos e líricos. Sapecou-me na cara um elogio que ainda me faz tremer, quando o leio. “Zé Nunes, é como um pintor chinês que, com uma pincelada, diz mil coisas”.
Agora, sem que esperássemos, pois tinha publicado recentemente importante obra poética “O IrReal e a Suspensão da Credulidade” – um tratado poético-filosófico – Solha apareceu com novo livro. “Autob/i/ografia” – um baita livro de memórias, mesmo que muitos dos textos sejam do conhecimento do público. Ele comenta fatos de sua vida desde os tempos de Sorocaba, onde nasceu, relembra os caminhos até chegar ao auge da carreira como escritor premiado.
Ele não é apenas escritor de romances. Como poeta, nos tem dado excelentes livros de poemas que chamam a atenção pelo conteúdo filosófico, político, social e religioso. Homem dedicado às artes, também se destaca como artista plástico, ator, roteirista de teatro e cinema. Descobriremos muitas coisas a seu respeito lendo sua “Autob/i/ografia”.
Tinha programado fazer a leitura do livro de Solha após concluir a releitura, mais uma vez, de “Guerra e Paz” de Tolstoi – todo final e começo de ano leio uma obra universal -, mas, às primeiras folhas percorridas do “Autob/i/ografia”, fui tomado de supetão e um rebuliço me impulsionou a não largar o livro.
A leitura de Solha é um desafio à memória, como são todos seus livros. Percorrer as trilhas apontadas por ele é andar por muitos caminhos literários, fazer contato com a arte no amplo sentido estético e filosófico, nas suas diferentes vertentes.
Ele não segue a narrativa linear própria das memórias, mas recorre ao tempo conforme suas lembranças, tudo se interligando. Isso é um diferencial na sua obra.
Um polímata, repleto de leituras, como Borges, enciclopédico, que andava com uma biblioteca na cabeça, Solha, em muitas ocasiões, tem concebido obras em diferentes gêneros em que aflora a sua intelectualidade multifacetária. Ele foi um leitor que cedo descobriu o encantamento e a riqueza das Artes na formação do homem.
Encerrei o ano com chave de ouro.
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A “Autobiografia” de W. J. Solha pode ser adquirida AQUI