Vamos passear de Monza? – Por Lenilson Oliveira

O que temos às mãos é uma novela policial bem ao estilo Nelson Rodrigues, só que ambientada na João Pessoa da década (talvez) de 1980. Com personagens bem delineadas física, social e psicologicamente e papéis mais que definidos na trama, desde as balzaquianas defunta e cuidadora (do pai da primeira), o malandro explorador (das duas), o delegado bonachão (em vias de se aposentar e que “achava que a época de ganhar dinheiro havia passado”), “O hálito da corrupção”, de Fernando Melo, mergulha nos bastidores corruptos da política e da administração pública, com incursão nos podres da justiça.

Nas pouco mais de 100 páginas do livro, o autor consegue envolver os leitores num enredo bem alinhavado, sem deixar de expor as agonias pessoais das personagens centrais e secundárias, situando-as na trama e justificando suas presenças ali, como o escrivão homossexual, o policial motorista, o repórter “furão”, a irmã solteirona do delegado, o bicheiro e sua amante, o juiz e sua esposa, o viúvo que não aparece, a suposta testemunha do crime…

A suposta testemunha do crime. Um escritor de romances policiais. Elemento surpresa que chega para deixar o delegado Tino Santo com a pulga atrás da orelha, não bastassem as pistas e suspeitos que já teria que estudar e seguir para a elucidação do assassinato da professora Velma Olinto, ex-mulher do influente médico, ex-deputado federal e amigo do governador. Raymond Chandler seria a chave para resolver o mistério?

Bem rodriguiano, Melo não nos responde. Nem na última linha. Como toda boa crônica policial, esta também não tem ponto final. Não espere, o leitor, um final redondo, com tudo e todos nos seus devidos lugares.

Sigamos sem spoiler, pois sim.

Entremos no Monza preto, quem sabe modelo 1982, ano do seu lançamento no Brasil, financiado por Velma e já devidamente quitado com seu salário de professora da UFPB. Passeemos nele pela João Pessoa da época. Visitemos todos os lugares da capital paraibana citados pelo narrador, mas nos detenhamos naquela rua de classe média do Bairro dos Estados. Casa 316. Investiguemos a cena do crime com nosso delegado, mas não deixemos de prestar atenção nos diversos ambientes, panos de fundo e diálogos entre as personagens e suas boas e más intenções.

Justificando o título, o autor coloca a corrupção como fio condutor da trama, desde os subterrâneos da polícia, da justiça e da política, como já foi dito. Temas como suborno, provas forjadas, vistas grossas à contravenção do jogo do bicho e da prostituição (de menores, inclusive), prevaricação por parte de agentes públicos e adultério permeiam as páginas de “O hálito da corrupção”, que requer uma leitura atenta dos amantes do bom romance policial.

Neste sentido, não faltam elementos e situações para prenderem a atenção e despertarem a curiosidade do leitor que, certamente, ficará ávido pelo final.

A sugerida viagem no Monza preto é curta, mas intensa. Com muitas paradas. Todas importantes e recheadas da boa construção literária.

Podem entrar!

 

Cajazeiras, num domingo de julho de 2023, ouvindo a Cabo Branco FM (JP)

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